Ele a encontrou quando ela ainda era uma menina. A verdade é que dela ele cuidou, com olhares apreensivos, como se zela criança que cresce solta correndo por entre o coreto da cidade do interior. Fazendo um favor a seus dois amigos irmãos que às vezes sumiam e o pediam para ficar somente vigiando a garotinha. Ele cuidou. Ela o achava bonito. Ele ficava longe, mas com os olhos próximos.
Os anos passaram. A menininha não precisava ser cuidada (ou achava isso). Eles se viam e se cumprimentavam nas férias. Às vezes, com um abraço desajeitado entretanto, sempre com um sorriso. Depois ela parou de vê-lo, ou ao menos havia se esquecido de se lembrar dele e quando deu por si era carnaval. A garota já tinha idade para sair sozinha, sem que os primos e irmãos cuidassem (totalmente) ou desde tal momento não precisaram mais pedir ao amigo para que lhe quebrassem o galho.
Foi neste carnaval que seus olhos se encontraram pela primeira de muitas vezes. Com este encontro veio incluído o sorriso de tempos atrás, o interesse por saber como ela estava, o que fazia. Havia crescido e ele sabia disso e não conseguiu desviar sua atenção dela e nem deixou que a desviassem dele também. O primeiro beijo: timido, prazeroso, escondido, roubado, tremido. Perto da igreja iluminada. Pois para quem vive em cidade histórica barroca compreende que em toda parte a qual se vai há um monumento desses velando por tudo. E a história dos dois ali se fundiu.
Tempos depois tiveram vários outros encontros. Esses vieram sem serem marcados, sem data, local e hora. Ele dizia que todas as vezes que vinha de férias pensava nela. E ela, por mais que tivesse conhecido outros garotos, quando se esbarravam esquecia-se do mundo a volta, das outras possibilidades e confiava no garoto de braços bem torneados, de tatuagem de dragão e de calos nas mãos bem cuidadas.
Vários foram os encontros e tantas mais as despedidas. A mais dolorida surgiu em um ano quando ele veio lhe dizer que mudaria de país. O chão dela ficou tortuoso e seu desejo era o de voltar a ser aquela garotinha para que não precisasse fitá-lo diretamente. Longe. Tão longe assim... Como seria? Não, não seria. Seguiriam suas vidas, simplesmente. Desta vez eles não puderam dizer até as próximas férias. O garoto de cabelos vermelhos embarcou. Com o coração aos pulos e a garganta doendo ela ficou. Aceitou. Decididamente.
Dois anos passaram sem que houvesse notícias. Havia o esquecido, afinal, amor mesmo não podia ser. Sua mãe, em um dia de verão, chegou em casa e disse algo sem pretensão (pois nem ela sabia de tal romance): "encontrei com a tia dele, ficamos conversando... se casou no estrangeiro". As últimas palavras soaram como eco em seu ouvido. Sorriu, sem graça, talvez. Mas sorriu. Decerto... E seguiu a vida.
Anos depois, outro carnaval. Este decididamente seria um bom feriado. Em frente a um bar, ameaçando chover na noite, a garota olhou adiante e seus olhos se esbarraram. Não, ela não quis acreditar! Não podia estar apenas imaginando. No entanto sua prima percebendo o que se passava falou: "cabelos assim, ruivos, se não forem os meus, são os dele. E eu estou aqui, ao seu lado. E você está vendo." Talvez ela nem escutasse mais. E os passos iam se aproximando dos seus pés presos ao chão. E o seu coração gritou com batimentos ferozes. Ele estava ali na frente dela, pronto para dar lhe um abraço apertado. E antes de dizer algo, o garoto a enlaçou o mais forte que pôde e mais como um suspiro ouviu "menina". Sim, continuava sendo a sua menina.
O barulho de todo um carnaval fez-se silêncio em seus lábios. Posteriormente foi dito que havia dado certo, e que ele nunca havia esquecido. E a afeição que ela julgava desaparecida emergiu mais uma vez. Contudo restava outra partida. E assim a passos pequenos ficava cada vez mais difícil dizer até breve.
Em um inverno ela voltou para casa de férias. Na primeira noite a menina tirou de dentro do armário uma blusa de frio. Dele. Dormiu com ela. Sentiu-se confortável. Dia seguinte resolveu checar seus e-mails e dentre vários havia um único nome que a deixava sem ar, dizendo em curtas palavras "estou no Brasil e quero te encontrar, se você também quiser". Foi o inverno mais lindo que passaram. Naquele julho agosto descobriram que independente do tempo que partilhavam era impossível não sentir falta.
No ano seguinte ele a surpreendeu ao voltar para o Natal. O coração dela ultrapassava boas batidas de maratonistas e quanto mais se aproximavam mais frio na barriga sentia. Ao se tocarem, a outra parte, sentiu o mesmo. Embora acostumados a tudo aquilo o último dia dos dois como disseram valeu por todo um ano. E em uma noite típica de verão ele disse que a amava. Assim, fácil, como se dissesse obrigado. Repetiu e concluiu dizendo que era para a menina dele aproveitar o ano que começava. Para fazer tudo o que ela tinha direito, pois quando ele voltasse, se continuassem dessa forma era a certeza que o garoto de cabelos marrons (não eram tão mais ruivos) aguardava. "Há anos a gente está junto. Toda vez que venho... A gente vai casar... é a gente vai casar... e eu volto daqui a um ano e meio, menina". Ela paralisada não soube se expressar. "Sim, vamos nos casar". E ficaram a fazer planos, abraçados, felizes como nunca. Ela somente perguntou: o que você viu em uma garota de 14 anos? Ele somente respondeu: O mesmo que continuo vendo nela 8 anos depois.
Eles não sabem, porém, um dia não mais terão que se despedir. Os dois por várias provas passarão. Conheceram e conhecerão diversas pessoas. Mas nenhuma as completam tanto. Ninguém os faz ter tremores de roda gigante e coração palpitante somente por pensar no mínimo detalhe. A diferença da idade não mais parece e nem interfere. Ela por toda uma vida será a menina dele. Ele por todo um sempre será o garoto dela.
E nesta semana ele ligou dizendo que comprou sua primeira panela de pressão e estava aprendendo a cozinhar. Ela achou aquilo a coisa mais linda do mundo e guardou as últimas palavras dele "não esquece de mim não, menina..."